quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Enfermeiro de contato

Falando sério agora. Esta internação atual comprovou a impressão que tenho do sistema hospitalar na Dinamarca. O atendimento que tenho recebido é realmente de primeira, embora não haja luxos. Aliás nem acho que um sistema público de saúde deva se dar ao luxo de proporcionar luxos. Deve apenas dar o melhor atendimento possível. Conheço algumas pessoas que tiveram experiências ruins em hospitais de Copenhague, mas eu não tenho do que me queixar.

Preciso novamente escrever sobre a gentileza, presteza e atenção que recebo dos enfermeiros dinamarqueses. Falo enfermeiros porque nesta internação pela primeira vez recebi os cuidados de enfermeiros do sexo masculino. Um deles é meu enfermeiro de contato, o que quer dizer que é ele quem vai acompanhar meu caso. Pare ele, só tenho elogios. Além de gentil, prestativo e atencioso, é doce e simpático.

Acesso de Dercy Gonçalves

Olhando para o resultado da cirurgia plástica por que passei três dias atrás, acho que consigo entender o prazer que Dercy Gonçalves sentiu ao expor orgulhosamente os seios cheios de silicone no desfile da Unidos do Viradouro no carnaval carioca em 1991. Quando olho para o ainda arremedo de seio que resultou da operação, me sinto não só alegre, mas também quase orgulhosa e tenho vontade de mostrá-lo a todas as visitas femininas que tenho recebido, como se fosse a oitava maravilha da cirurgia plástica mundial.

Se obedecesse aos meus instintos, sairia pelos corredores do hospital, a minha passarela do samba, com os seios desnudos ostentando meu peito impávido, embora nem tão colossal. Poderia até usar minha maca como uma espécie de carro alegórico empurrado pelos enfermeiros que certamente me acompanhariam num cortejo barulhento e alegre.

Mas meus pruridos moralistas me impedem de levar adiante a ideia de um desfile peitoral. Afinal, o carnaval já passou. E tem mais. Eu correria o risco de ter minha alegria confundida com loucura e de me ver transferida para o departamento psiquiátrico do hospital.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

De uma cama de hospital

Adoro avanços tecnológicos que me permitem, aqui, de uma cama de um hospital na Dinamarca, continuar a escrever meu blog, me comunicar com minha família e continuar acompanhando o noticiário no Brasil. Pois é, estou novamente internada no Rigshospitalet, o maior hospital da Dinamarca. Desta vez o motivo me deixa alegre: fui submetida a uma cirurgia plástica para reconstrução do meu seio esquerdo, a que foi removida devido ao câncer de mama.

A cirurgia aconteceu antes de ontem e tudo correu como planejado. Os médicos fizeram um corte de uns cinco centímetros sobre a antiga cicatriz e colocaram sob a pele e músculo peitoral uma espécie de balão chamado de expander (ekspander em dinamarquês) que encheram com uma solução salina. Daqui a duas semanas terei de voltar ao hospital para que o balão receba mais líquido. O enchimento do balão vai se repetir por outras quatro a seis vezes. Três a quatro meses depois da última vez que encherem o balão do meu peito, serei operada novamente para que um implante definitivo de silicone seja implantado.

Todo o procedimento com o expander se fez necessário porque, quando fui operada para retirada do tumor, parte da pele do peito também foi retirada. Portanto, para que um implante de silicone coubesse sob a minha pele, ela teria de se expandir, o que está sendo possível graças ao expander.

Ufa! Espero que minha explicação de paciente leiga esteja correta. Tanta explicação científica me lembra dos meus tempos de repórter da revista Ciência Hoje. Ah, que saudade de jornalismo científico. Por favor médicos de plantão, me corrijam se escrevi alguma besteira.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Que vergonha!

Fiquei sabendo da prisão do governador eleito do Distrito Federal José Roberto Arruda com um dia de atraso. Só hoje à noite vi as manchetes dos jornais brasileiros sobre o assunto. Fiquei surpresa, pois não tinha muita esperança de que o fosse se desenvolver tão rapidamente, e aliviada. Quem sabe Brasília finalmente se livre dessa corja que tomou conta da minha cidade natal.

Algo que me deixou boquiaberta e até um pouco constrangida porque ainda me considero uma jornalista, embora esteja afastada da profissão, foi a participação de tantos jornalistas nas tramoias do Arruda. O que me deixou ainda mais de queixo caído foi ver jornalistas com quem trabalhei em jornais de Brasília envolvidos até o pescoço no mensalão do governo do DF.

Pensei sobre o que teria a dizer a esses meus ex-colegas. Só duas palavras: Que vergonha!

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Cidade dos ciclistas II

Hoje fui de bicicleta para o trabalho e quebrei o jejum de seis semanas sem pedalar. Foi ótimo voltar a me mover sobre duas rodas e a temperatura de três graus centígrados negativos não foi grande problema, mas amanhã vou ter de reavaliar se vou me atrever a pedalar novamente. Algumas das pistas que uso no caminho para o trabalho, principalmente as daqui perto de casa, continuam cobertas de gelo ou neve. Pedalei do trabalho até o jardim de infância da minha filha, mas de lá achei melhor andar puxando a bicicleta com minha filha sentada na cadeirinha da garupa para não correr o risco de queda.

Nisso tenho que dar o braço a torcer: dinamarquês é mesmo duro na queda quando se trata de pedalar. Mesmo com o gelo cobrindo as pistas e montes de bloqueando ruas, ele não desiste do bom hábito de pedalar. É claro que há exceções: em dias de tempestades de neve ou vento, quando até mesmo o serviço de meteorologia aconselha ciclistas e motoristas a usar o transporte público, há pouquíssimos que ousam desafiar a sorte.

Mas desde que voltei do Brasil tenho visto o trânsito de bicicletas pouco alterado pelos centímetros e centímetros de neve que têm caído em Copenhague. É certo que o número de ciclistas sempre diminui no inverno, mas dá par ver que a grande maioria dos ciclistas já está de volta às pistas depois da tempestade de neve da semana passada. Aliás, de acordo com o blog www.copenhagenize.com, diariamente cerca de 500.000 pessoas preferem pedalar a usar carros ou o transporte coletivo Copenhague. Isso corresponderia a 37 por cento das pessoas que cruzam os limites da cidade e 55 por cento das pessoas que vivem no centro da capital dinamarquesa.

A rede excelente de ciclovias e a boa sinalização das ruas estimulam e tornam mais seguro pedalar em Copenhague. A geografia também ajuda. A cidade é predominantemente plana, com poucas e suaves elevações.

Fazendo bom uso de tantas condições vantajosas, os habitantes de Copenhague se movem e movem quase de tudo em suas bicicletas. Já vi gente se equilibrando sobre as duas rodas carregando galões de tinta, cachorro, gato, engradados de cerveja, uma poltrona, outra bicicleta, árvore de natal, pneus de carro, material de construção e televisão. De modo geral a ousadia é bem sucedida, embora também já tenha visto o asfalto da pista para ciclistas coberto com a tinta verde que alguém deixou derramar, provavelmente devido a uma queda da bicicleta.

Tudo que é tipo de bicicleta se encontra por aqui: com cesta na frente do guidom, com cesta no bagageiro, com três rodas, a chamada bicicleta Christiania (link) que tem um vagãozinho na frente para crianças, modelo tradicional, modelo mountain bike, elétricas, com dois guidons para ciclistas apaixonados, com cabo puxando uma terceira roda para uma criança ir pedalando atrás .
Algo que adoro ver são as flores de plástico que enfeitam as cestas das bicicletas das moças mais românticas, como a vista nesta bela foto do Lars Daniel no Flickr.

Sobre os perigos de se pedalar em pista coberta de gelo, vale dar uma olhada no vídeo abaixo, feito na Holanda, outra terra de ciclistas. Felizmente, parece que ninguém se machucou, mas fica a pergunta: por que o ser humano que filmou o vídeo não desceu para a rua para colocar um pouco de sal ou areia na pista e ajudar a evitar as quedas?

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Brrrrrrr

Hoje vi uma poça d'água líquida na porta de casa ontem de manhã. Grande coisa, o caro leitor deve estar pensando. Mas é grande coisa sim senhor. Desde que voltei de um mês de férias no Brasil, no sábado, foi a primeira vez que vi uma poça de lama em estado líquido. Até então, neste que foi o janeiro mais frio dos últimos 23 anos na Dinamarca, água ao ar livre, só congelada. Foi uma visão alvissareira de início de fevereiro que, no entanto, durou pouco.

De 1 grau centígrado de manhã, a temperatura caiu para menos dois à tarde, e teria despencado para cerca de 12 graus negativos hoje à noite, segundo o serviço meteorológico daqui. Tentei checar se a baixíssima temperatura se confirmou, mas site do instituto de meteorologia da Dinamarca estava fora do ar, provavelmente como consequência do aumento da procura por informações sobre a tempestade de neve que está começando agora.

(Agora! “Calma, calma, não entre em pânico”, digo a mim mesma.)

Daqui a pouco vou buscar minha filha no jardim de infância e acabei de saber que o pior da tempestade vai ser entre as 15 e as 19 horas. Legal né? Eu havia planejado sair de casa exatamente às 15 horas. Acho que vou ter de rever meus planos.

Ontem, concluí que hoje não daria para usar o automóvel para buscar minha filha. O pai a levou de manhã, quando o vento ainda não era forte, mas hoje à tarde vou ter de enfrentar a tempestade a pé puxando um trenó de plástico no qual vou puxar a Gabi no caminho de volta para casa. Ela, claro, vai adorar, se o vento não estiver forte demais e fazer com que a neve doa quando bater na pele do rosto, a única parte descoberta do corpo.

Ontem foi quase impossível encontrar um lugar seguro para estacionar já que a rua do jardim de infância está quase bloqueada pela neve. À tarde, quando tentei estacionar, o carro patinou na neve e tive de manobrar de ré para não ficar atolada. Dei uma volta pelo quarteirão para tentar achar uma vaga e voltei ao mesmo lugar da patinação automobilística, onde a rua ficou bloqueda por 15 minutos por neve e um carro estacionado meio na transversal pela mãe de um coleguinha da minha filha.

Bonito né? Realmente é muito bonito. Tudo branquinho, coberto de neve. Mas dá um trabalho. E me faz lembrar com saudade das férias na Bahia e cantarolar “I don't want to stay here, I wanna to (sic) go back to Bahia” (confira o Paulo Diniz no link enviado por uma amiga.