segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Paradoxo

Muito interessante um artigo escrito pelos estudantes da Universidade de Yale Yasmin Zaher and Saned Raouf para o Huffington Post sobre a situacão dos refugiados iraquianos na Dinamarca e a remocão dos refugiados da Igreja Brorsons:
The Modern Making of Refugee Politics
Falam, entre outras coisas, do paradoxo de um país que está no topo do ranking de países com o mais alto grau de felicidade ser o mesmo que impõe repetidos traumas psicológicos aos refugiados iraquianos que lutam por uma chance de ter uma vida decente.

domingo, 23 de agosto de 2009

Bisian

Bisian e sua família estava entre os iraquianos que buscaram refúgio na Igreja Brorsons e entre os cerca de 250 iraquianos que tiveram seus pedidos de asilo rejeitado pelo governo dinamarquês e estão sendo ameaçados de serem enviados de volta para o Iraque. Ela tem 14 anos de idade, não fala árabe e vive na Dinamarca desde os quatro. Nesses dez anos na Dinamarca, ela e a família viveram em campos de refugiados.

A irmã caçula de Bisian nasceu na Dinamarca e tem menos de dois anos de idade. O irmão mais velho, segunda ela conta no site kirkeasyl.dk (site de um movimento de dinamarqueses que apoiam os refugiados iraquianos), sonha em estudar carpintaria mas foi proibido de prosseguir os estudos pelas autoridades dinamarquesas. Algo parecido aconteceu com a mãe de Bisian que começou a fazer um curso de cabeleireira mas teve de parar devido às regras para refugiados à espera de permanência.

Bisian sonha com uma vida “normal” na Dinamarca e teme a violência no Iraque. Lá, ela acha que a família não tem nenhuma chance especialmente porque seu pai está marcado para morrer no Iraque. “Lá há gente atrás dele”.

domingo, 16 de agosto de 2009

Wissam

O Wissam é um rapaz iraquiano de 19 anos de idade que vive na Dinamarca desde que tinha 10.  Ele foi um dos 60 iraquianos que passaram parte do verão deste ano na igreja Brorsons, juntamente com seus pais e irmão mais velho, de 23 anos. Desde 30 de julho ele está na prisão do campo de refugiados de Sandholmlejren.

Wissam e sua família foram presos antes da ação policial na igreja Brorsons. Numa longa entrevista ao jornalista Olav Hergel, na edição deste domingo do jornal Politiken, ele fala sobre sua adolescência na Dinamarca e no medo de voltar para o Iraque, e no quanto ele sonha em ter direito a viver na Dinamarca. Wissam fala dinamarques fluentemente, além de inglês, persa, curdo e árabe e tem uma namorada chamada Rosa. Seu irmão acabou de ser aceito como aluno da Universidade Ténica de Copenhague, mas não sabe se vai poder fazer o curso.

Ele pertence a um grupo étnico, os feyli curdos, dos quais tanto iraquianos quanto iranianos querem se livrar. A advogada da família conseguiu documentar que 15 membros da família de Wissam, que vive numa região próxima a Bagdah, foram mortos nos últimos anos como consequência de perseguição étnica.

sábado, 15 de agosto de 2009

Remoção

Há períodos em que evito ler jornais ou assistir a noticiários dinamarqueses para evitar me aborrecer. Estou num desses períodos. Desta vez, a razão para possível aborrecimento é a expulsão de um grupo de iraquianos de uma igreja de Copenhague, acontecida na madrugada da última quinta-feira .

Os iraquianos tinham ocupado a igreja havia quase três meses (ver Mahabat e seus dois meninos ) e nesse período eu vinha torcendo e quase acreditando, do fundo do meu otimismo ou ingenuidade, que algo aconteceria para que pelos menos alguns fossem autorizados a continuar vivendo na Dinamarca. Mas me esqueci em que país estava e cheguei a ficar chocada quando soube que a polícia havia invadido a igreja Brorsons no meio da madrugada e prendido todos os 17 homens que estavam lá. Nenhuma mulher ou criança foi presa, mas todos tiveram de abandonar a igreja.

Pelos relatos que li e ouvi, inclusive a do pastor da igreja, a remoção dos iraquianos foi dramática. Quando a polícia entrou na igreja, todos os iraquianos se juntaram no altar. Um homem quebrou uma garrafa e ameaçou se cortar, um outro subiu no órgão da igreja e ameaçou pular, mulheres gritavam de desespero enquanto crianças choravam de medo. A invasão aconteceu por volta da uma da madrugada e, por mais que leio que tudo foi feito dentro da lei, nada me convence que não foi mais um da série de atos desumanos da política para refugiados adotada pelo atual governo dinamarquês (mais sobre o assunto em inglês e cenas da ação policial contra um grupo de demonstrantes dinamarqueses que tentou bloquear a passagem do ônibus da polícia que levava os iraquianos).

No dia seguinte à remoção, 15.000 a 25.000 pessoas (como sempre acontece em demonstrações de rua, a quantidade de participantes depende da fonte da informação) se reuniram em frente à igreja para protestar contra a ação da polícia e pedir asilo aos iraquianos. Quando soube da manifestação até fiquei animada. Quem sabe a ação policial não acaba criando uma comoção nacional de apoios aos iraquianos que assim podem afinal conseguir o apoio político necessário para que seus pedidos de asilo sejam reavaliados? pensei novamente do fundo da minha alma otimista ou ingênua. Que nada. No dia seguinte ao da demonstração, pesquisas de opinião pública mostraram que três quintos da população dinamarquesa apoiaram a ação policial.

Conclusão: parei de ler jornais ou páginas da internet da Dinamarca para não morrer de raiva. Até hoje, é claro, quando tive de me atualizar para escrever o blog. Aí deparei com mais uma, duas, não, três histórias de, com o perdão da expressão, cortar o coração: as do Wissam, do Hassan e da Bisian.

sábado, 8 de agosto de 2009

Dia dos pais

Amanhã seria dia de ligar para meu pai e lhe desejar feliz dia dos pais. Na minha família sempre fomos críticos do caráter comercial dessas datas, mas assim mesmo embarcamos sem pestanajar na onda de presentes e reuniões familiares nos dias das mães e dos pais.

Antes de me mudar para a Dinamarca, dia dos pais tinha invariavelmente reunião da família toda em torno de uma churrasqueira e presentes para o meu pai, que nesse dia via uma das vantagens de ter tido cinco filhos.

Para meus irmãos, minha mãe e eu, a semana que antecedia o segundo domingo de agosto era de dúvidas sobre o que dar ao ”melhor pai do mundo” que também podia às vezes se comportar como ”o pai mais chato do mundo”. Como era difícil presentear meu pai. Ferramenta era quase certo que ele ia gostar de receber, mas ele já tinha tanta geringonça que ninguém mais tinha vontade de lhe dar uma nova. Livro era meio complicado, porque, ao contrário da minha mãe, ele nunca foi muito de ler. Roupas ou sapatos, claro, seriam a alternativa mais correta, porque, como minha mãe dizia, ele andaria como um mendigo se não fosse as roupas e sapatos que nós comprávamos para ele. Não que lhe faltasse dinheiro para isso, mas é que ele nunca encontrava tempo para compras.

Mas comprar sapatos e, principalmente, roupas para meu pai, era um esporte arriscado. Nos últimos anos ele ficou mais tolerante, mas durante muito tempo tive a impressão de que nada que eu dava a ele o agradava. Ele sempre agradecia, é claro, mas na primeira oportunidade soltava algo como ”essa camisa é muito bonita mas essa gola não é meio assim como a de um pastor?” ou ”calça de boa qualidade, hein minha filha, pena que falta um bolso aqui”. Pois é, calça comprida para meu pai tinha de ter bolsos, muitos bolsos. No da direita, ele colocava a carteira, no da esquerda, uma cadernetinha, no da perna direita, uma caneta e um canivetinho, no da esquerda, o chaveiro. Nos bolsos dos fundos, nada, claro, porque ”eu também não sou bobo de dar mole para batedor de carteira” A necessidade de bolsos do meu pai Juarez era tanta que ele chegou a mandar alguém costurar bolsos extra em algumas das suas calças.

Nos bolsos iam também as listas de compras de supermercado que ele precisava fazer. Lá em casa sempre foi meu pai o maior responsável pelas compras de supermercado. Nos supermercados, mercadinhos, frutarias e feiras de Taguatinga, ele todo mês deixava boa parte de seu salário de policial militar.

Aliás, para compras de alimentos o seu Juarez sempre tinha tempo. Ele sentia um prazer imenso em abastecer a casa de comida, comida e comida. Acho que talvez porque ele se orgulhasse de nos ver atacando uma melancia deliciosa que ele havia comprado, confirmando o talento dele de quase sempre acertar na hora de comprar frutas e verduras. Ou nos ver devorando um frango assado preparado com um tempero delicioso que já tentei inúmeras vezes copiar. Ele gostava tanto de nos encher de comida, que mesmo no dia dos pais muitas frequentemente era ele que ia para a churrasqueira cuidar da carne, frango e linguiças que passaríamos um dia quase inteiro comendo.

Depois que me mudei para a Dinamarca, disse adeus a esses domingões dos dias dos pais. A preocupação sobre o presente também diminuiu porque depois de algum tempo passei a comprar apenas um presente pelo Natal, aniversário e dia dos pais, e entregá-lo pessoalmente nas minhas visitas anuais ao Brasil. Para mim, no dia dos pais sobrou apenas aquele telefonema, quase sagrado, que eu dava todo ano ao meu pai. Amanhã será o segundo dia dos pais em que nem isso vou poder fazer.

Ai pai. Como a saudade dói.

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Direito de todo mundo

Devo admitir que estou ficando mais fã da Suécia. O país começou a me ganhar quando soube que lá eles tratam os refugiados iraquianos com muito mais respeito do que aqui na terra da rainha que é minha xará. E agora, depois de ter passado uma semana em Småland, uma região no sul do país, voltei meio encantada com algumas facetas da sociedade sueca.

Uma delas é o que lá chamam “Allemansrätten”, o que em português seria algo como direito de público acesso ou, numa tradução bem direta, o direito de todos os homens. A tradição e a constituição suecas ditam que todo mundo tem direito a andar, pedalar, correr, cavalgar, esquiar e até mesmo acampar em qualquer área natural, com exceção de jardins particulares, na proximidade de uma residência ou em terra sendo cultivada.

Isso quer dizer que qualquer pessoa pode pegar sua barraca e acampar no meio de uma floresta ou numa praia sem se preocupar se está invadindo uma propriedade particular. Ou levar sua canoa para uma lagoa e remar até cansar. Há algumas restrições quanto a reservas naturais, mas do contrário, toda a beleza natural do país, o que inclui montanhas, lagos, glaciais e florestas está à disposição de quem quiser admirá-la e curti-la. Um visitante pode até colher flores, cogumelos e amoras silvestres, se isso não incluir espécies protegidas. Claro que o direito implica em responsabilidades: o visitante deve proteger a natureza e evitar qualquer dano ao meio ambiente.

Por trás da norma está o princípio de que a natureza pertence e é para ser apreciada por todos. Para mim, um princípio que deveria se transformar em lei universal, embora eu saiba que a ideia causaria arrepios a proprietários de terras de países como o Brasil e a Dinamarca. Ainda assim não consigo deixar de pensar e lamentar os lagos e praias aos quais me foram negados acesso aqui na Dinamarca, as cercas intimidadoras das propriedades rurais no interior brasileiro ou as ilhas particulares de Angra dos Reis.

domingo, 2 de agosto de 2009

Retorno

Voltei hoje à Dinamarca, depois de oito dias no mato sueco, num lugar chamado Lindehult. Ao chegar em casa, o e-mail de uma amiga trouxe uma descoberta: um grupo esloveno, o Perpetuum Jazzile, cantando Aquarela do Brasil de maneira brilhante. Eu nunca poderia imaginar que a música brasileira fosse tão bem cantada por aquelas bandas.

Com eles canta um grupo vocal brasileiro, o BR6, que eu não conhecia e passei a admirar. Sobre eles há um video no Youtube.