sexta-feira, 18 de abril de 2008

Bandagem

O pior, até agora, foi quando tiraram a bandagem que cobria o ferimento deixado pela operação para retirada do meu seio esquerdo. Até então o corte de quase vinte centímetros estava coberto por gaze e embora fosse evidente que ali näo havia mais um seio, era como se o curativo me protegesse de encarar meu corpo mutilado.

O curativo foi retirado dois dias depois da operação e, graças aos deuses, ninguém ocupava a cama ao lado da minha e o Henrik tinha vindo me visitar depois de ter levado a Gabi para a creche. Foi simplesmente horrível. Olhar para o que não havia mais, um peito metade vazio, riscado por um corte enorme, mais parecendo o de uma menina de oito anos. Do outro lado o seio direito, pateticamente solitário.

Esteticamente talvez tivesse ficado melhor se os dois seios fossem retirados. Mas isso teria significado que a doença tinha se espalhado mais do que os 1,9 cm de caroço, mais algumas células em estado pré-cancerígeno por perto e mais três nódulos linfáticos contaminados.

Me senti desconsolada, muito triste e chorei forte e alto como ainda não tinha chorado desde o início desse pesadelo. Usar a palavra pesadelo é cliché, mas é difícil encontrar uma outra melhor. Nos primeiros dias acordava de manhã meio esquecida de tudo que havia acontecido e do que ainda estava por acontecer: eu sofria de cancer de mama, tinham me retirado um seio, eu era uma aleijada e ainda teria que passar por meses de um tratamento cujos efeitos colaterais mais parecem uma segunda doença sem ter certeza de que no final de tudo isso eu sobreviria a essa doença maldita.

Razões para otimismo há, sem dúvida, mas naquele momento nada era capaz de amenizar a dor, o desespero, o desamparo. Me senti tão feia. Horrorosa. Dona de um corpo que pode assustar crianças e chocar adultos.

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